Simon Sinek e Daniel Kahneman Entram Num Bar
Nota: Este artigo foi escrito originalmente em abril de 2022 e publicado em meu blog anterior. Decidi republicá-lo aqui por ainda acreditar na força do seu conteúdo e na relevância das reflexões que ele provoca ao conectar ideias de Simon Sinek e Daniel Kahneman. Aproveite a leitura!
Ah! E a versão em podcast continua online.
O Start With Why de Simon Sinek é uma leitura clássica que estava devendo há bastante tempo. Nele, Sinek expande e detalha como o Golden Circle e o equilíbrio entre seus três níveis (com foco no Porquê) é a ideia central para trazer crescimento sustentável para um negócio, marca ou ideia.
Que livro Legal! E que contador de histórias é Simon Sinek. São dezenas de relatos sobre empresas e empreendedores que deram certo ou errado. As ideias parecem perfeitamente conectadas e, mesmo sem ter terminado o livro, sinto que já sei o caminho para fundar a próxima Apple. Não que esse seja o meu desejo, mas o caminho está praticamente todo lá.
O Poder da Inspiração
Na prática, o livro mostra as características de um líder inspirador e como ele influencia o comportamento de outros indivíduos (liderados, clientes, eleitores, investidores).
Para Sinek, o iPhone ser o melhor produto do mercado não é uma pré-condição de sucesso. Isso acontece porque os clientes da Apple nem olham produtos de outras marcas, de tão fascinados e alinhados com as crenças e a imagem — de desafiar o status quo — que a Apple construiu.
E foi aí que pensei: "Peraí! Que bom para a Apple que ela não precisa ter o melhor produto. Mas e o cliente/usuário? Não seria melhor para ele ter um telefone melhor, ou mais barato?"
(Disclaimer: Não estou afirmando – nem negando – que existe uma opção objetivamente melhor.)O Encontro Imaginário: Sinek vs. Kahneman
Foi nesse momento que comecei a conectar o tema com tudo que tenho aprendido sobre economia comportamental nos últimos anos. E imaginei como seria uma conversa de bar entre Simon Sinek e Daniel Kahneman, um dos maiores expoentes da Psicologia Aplicada à Economia.
No mainstream da economia comportamental, um dos livros mais importantes é o Rápido e Devagar (Kahneman, 2011). No livro, ele nos guia pelo funcionamento do cérebro humano em relação às decisões que tomamos.
Apesar de o próprio Kahneman reconhecer a utilidade do que ele chama de Sistema 1 (a parte do cérebro que toma decisões rápidas e intuitivas), muito do livro é voltado a explicar por que temos uma confiança excessiva nessas decisões intuitivas e como isso piora a qualidade das escolhas.
Sinek, por outro lado, usa todo tipo de argumento para validar essas decisões intuitivas e atrelá-las a sentimentos mais profundos, conectados com nossos porquês e propósitos. Ele usa o termo Gut decisions (decisões do instinto/intestino) para essas decisões que parecem vir de um lugar mais profundo e que "feels right" (sinto que estão certas), em contraponto ao "I think it’s right" (acho que está certo).
O Ponto de Vista de Kahneman
Se Sinek e Kahneman se encontrassem num bar e falassem sobre o trabalho de cada um, a conversa de Kahneman com a esposa, depois, poderia ser mais ou menos por aqui:
"— A gente ficou batendo papo e, certamente, ele tem um ponto. Para criar, crescer um negócio e ter sucesso, você precisa ser capaz de inspirar. E um propósito, uma visão revolucionária, claro que impacta comportamento."
"— Só fiquei aqui pensando se, no longo prazo, a inspiração pela inspiração vai levar as pessoas a se darem melhor ou pior."
Claro que a maioria das histórias que Sinek conta — as que dão certo — partem de motivações nobres e inovadoras, como Martin Luther King Jr., os irmãos Wright e a própria Apple. Mas a verdade é que dá para inspirar muita gente a fazer muita coisa errada por uma causa. Todo mundo é herói na sua própria história.
Outra coisa: Sinek atribui um valor maior, intrínseco, a essas decisões instintivas (Gut Decision). Estudando economia comportamental, aprendemos que tomamos essas decisões com mais confiança, mas que não costumam ser mais corretas. Em decisões mais complexas, a correlação é negativa.
O Poder da História: Onde Sinek Acerta
Agora, onde Simon Sinek acerta em cheio? No poder da história.
Uma boa história é capaz de inspirar e motivar qualquer um, a fazer qualquer coisa. Aprendi com o Castanha, meu antigo chefe e amigo, a quebrar o termo storytelling em dois:
Story: Ter uma boa história para contar.
Telling: Empregar as ferramentas e o método para torná-la ainda mais interessante.
Sinek é genial contando histórias para nos ensinar a liderar e motivar pelo porquê. É só dar uma olhada no LinkedIn dele, nas entrevistas, no TED Talks, que você vai entender instantaneamente que uma boa história direciona comportamento e tomada de decisão.
Justamente por esse poder, cada vez mais histórias são milimetricamente pensadas para nos motivar ou influenciar. O problema é que nem sempre nos guiam para a direção onde gostaríamos de ir, não fosse o show de luzes.
Quer dizer, eu abro o Instagram e vem lá o cara que paga o café com um trade de criptomoeda e sai de Lamborghini. É uma baita história, mas olhando com um pouco mais de cuidado, já dá para ver que ali tem um propósito bem menos nobre.
Estas são as ideias que eu quero deixar com vocês hoje:
Desconfie das suas decisões instintivas, principalmente em decisões complexas e não recorrentes (a maioria das importantes, né?).
Reconheçam o poder que as histórias têm, e usem-no para influenciar a vida das pessoas para melhor, na régua da própria pessoa e não na sua.
Espero que vocês tenham gostado dessa reflexão. Eu adoraria trocar mais ideias com vocês e ouvir a opinião de cada um nos comentários.